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CRP 07/23430
Profissionalmente, através da minha experiência clínica e empresarial como psicanalista, atendendo e acolhendo crianças, adolescentes, adultos e idosos, tenho observado atentamente um aumento na dificuldade de diálogo entre as pessoas e, como consequência disso, o agravamento de conflitos internos e externos dos indivíduos. A incompreensão do “discurso” (falas, expressões e intensões) do outro, aliada à falta de paciência, acentua intolerâncias a tudo aquilo que não é exatamente como “Eu” espero ou desejo.
A sociedade atual com tamanha evolução tecnológica, aliada a uma cultura de aceleração com reivindicações por vezes cruéis, exige das pessoas disponibilidade de tempo integral, profissionalismo, beleza e simpatia, onde todos precisam estar sempre prontos para tudo. Neste contexto, fadado ao adoecimento, o indivíduo que mais se destaca é, em regra, o que tem menos vida própria, uma vez que, está sempre a serviço dos “outros”. A conectividade digital, muitas vezes, coexiste com a desconexão interpessoal e pessoal. As relações tornam-se superficiais, contribuindo para o retraimento social. Embora, muitos relatem as trocas feitas com amigos virtuais, faltam encontros presenciais.
Os filhos ficam para depois, não há tempo para ir ao médico, não há tempo para ir ao banheiro, para comer, impossível sair com amigos, mas, para o celular e para “Rede”, sempre haverá tempo disponível, afinal de contas - estamos “trabalhando”. Enfim, em muitos momentos em que nossa presença, olhar, tom de voz e atenção são indispensáveis, nos ausentamos. Isso é muito grave.
O excesso de tempo dedicado às mídias sociais amplia a busca por validação externa. A comparação constante com vidas aparentemente perfeitas, pode alimentar sentimentos de inadequação e baixa autoestima. A exposição à padrões irreais de beleza, sucesso e felicidade também contribuem para distorções na percepção da realidade. Frente a todo esse ideal, que não pode ser atingido, a saúde mental fica comprometida.
Como o tratamento psicanalítico trabalha essa e outras questões da saúde mental?
Freud já destacava a importância fundamental da comunicação verbal no processo terapêutico psicanalítico: "a cura é pela fala". Para ele, o ato de falar durante a análise permite ao paciente acessar e expressar seus pensamentos, sentimentos e memórias inconscientes que, muitas vezes, estão reprimidos ou desconhecidos. Esse processo de livre associação, ou seja, de fala livre, num ambiente seguro e ético, permite ao paciente falar sobre o seu sofrimento e, através do diálogo com o analista, ter a possibilidade de revisitar e reinterpretar experiências passadas, construir novas narrativas, bem como encontrar formas mais saudáveis de lidar com suas questões, ressignificando afetos.
Freud vai além das palavras, escutando o que é dito, mas também, aquilo que é não dito. Em seu discurso, o analisante diz o que quer contar, mas também, o que ele quer esconder. Assim, o psicanalista se propõe escutar o que não ouve, ir além do que se vê, escutando o conflito, a dor dos sujeitos de forma acolhedora e sem julgamentos. Diálogos autênticos e conexões humanas são fontes de bem-estar psicológico.
Em análise, o paciente é convocado a pensar nos motivos que o fazem calar ou mesmo fugir inconscientemente da realidade. De forma apropriada, permite-se sentir, conviver e integrar as realidades internas e externas em busca de um equilíbrio saudável.
Por fim, aquele que se debruçar no processo analítico e que desejar se tratar, poderá aprender a lidar com sua história passada, organizando um futuro sem que os traumas e dores determinem suas cenas.
Embora muitos digam que a psicanálise é um tratamento demorado, dizemos que não. Assim, a psicanalista Ana Suy esclarece: “é um tratamento profundo” e que não trabalha apenas o problema a ser resolvido, o sintoma, mas sim, coloca o sujeito em xeque, questionando sua maneira de viver a vida e isso muda a relação que se tem com as pessoas, consigo mesmo e com a vida.
Para tanto, em nossas vivências na sociedade atual, tecnológica ou não, é preciso equilíbrio entre o mundo digital e o off-line, entre as chamadas de vídeo e os cafés, entre as mensagens e as conversas ao ar livre. Prudência é imprescindível para saúde mental.